Privatização da ANA (4) – Leitura Crítica do “Quadro Jurídico Geral”


Introdução

*O “quadro jurídico geral da concessão de serviço público aeroportuário”

No âmbito da privatização da ANA, o Governo acaba de aprovar o “quadro jurídico geral da concessão de serviço público aeroportuário” (Link). Este decreto-lei 

-é uma sistematização de toda a legislação sobre a matéria, com uma excepção significativa, que analisamos a seguir,

-republica disposições sobre “taxas a cobrar” (1), quase ao nível de Decreto Regulamentar,

-salvo análise mais profunda clarifica os poderes do Estado, que são concedidos à ANA,

-arruma em duas penadas, três temas fundamentais: o do Contrato de Concessão entre o Estado e a ANA, o do Serviço Público Aeroportuário e o da Regulação Económica (2) da Gestão dos Aeroportos de Portugal, pela futura ANA privatizada.

*Um filho do que há de errado no Processo de Privatização da ANA

O presente decreto-lei tem de ser compreendido no quadro do que há de errado no processo de privatização da ANA

-desde o Programa do Governo, o calendário da privatização da ANA reduz-se a seguir o da TAP, numa óptica que apenas visa o encaixe,

-em ano e meio o Governo não faz o trabalho de casa: aprovar o Decreto-Lei das Bases do Contrato de Concessão a estabelecer com o Concessionário, aprovar a sua minuta em Resolução do Conselho de Ministros, implementar a Regulação Económica e da Qualidade de Serviço (definida em 2009) e criar a verdadeira «entidade reguladora independente», então prevista,

-mais concretamente, o Governo não se ocupa do que o seu Programa prevê em relação com a privatização da ANA: o “reenquadramento regulatório do sistema aeroportuário”,

-uma demora do Governo, que se arrasta e um súbito apressar do processo, nitidamente por pressão de UE/BCE/FMI,

-um inusitado acelerar do apressar do processo, quando a receita da Concessão pode contribuir para minorar o deficit das Contas Públicas.

Só no futuro saberemos o preço a pagar, porque é certo termos de o pagar, por este processo atribulado em si e pela ponta final da sua ligação ao minorar do deficit público de 2012.

*Uma Leitura Crítica

Apesar de não dispormos de muita da informação que devia ser pública, arriscamos fazer uma leitura crítica do decreto-lei sobre o “quadro jurídico legal” de que vamos depender.

Assumimos este trabalho, A Bem da Nação, na perfeita consciência de estarmos a viver mais um exemplo de uma prática nacional que temos de alterar:

-contrariamente a excelentes exemplos de outros países (brevemente divulgaremos os do Reino Unido, Irlanda e França), em Portugal, Parlamento, Governo e INAC não fomentam o debate sobre decretos-leis importantes para o País, e sobre a preparação de diplomas comunitários, mais a sua transposição para o ordenamento jurídico nacional.

Do outro lado, Universidades, Associações ou Confederações, como as do Turismo e Industria, mantêm um silêncio que se vai traduzir em prejuízos futuros. E quando se manifestam, como é o caso das forças vivas do Porto, há, salvo o devido respeito, excesso de regionalismo e falta de preparação técnica, sem a qual não há intervenção positiva e frutuosa.

*Uma Pergunta Repetitiva

De cada vez que analisamos e criticamos uma disposição do decreto-lei, o leitor DEVE ASSUMIR QUE FORMULAMOS SEMPRE A MESMA PERGUNTA:

-QUAL O GANHO QUE A DISPOSIÇÃO REPRESENTA PARA O INTERESSE PUBLICO?

Suspeitamos, mas não podemos provar, que a resposta conduz sempre a uma noção de Interesse Público que se identifica com o “aumentar o encaixe, por via de dar liberdade ao concessionário”. Cada leitor avaliará se esta liberdade corresponde à sua noção de Interesse Público.

 

a)Curta Introdução à Regulação Económica dos Aeroportos de Portugal

*Mercado Cativo, Mercado Competitivo e Regulação Económica da Gestão dos Aeroportos de Portugal

Mercado cativo é o forçado a utilizar os Aeroportos de Portugal: a quase totalidade dos residentes no país e alguns não residentes (entre outros, viagens de negócios, de emigrantes e de proprietários de residências do tempo livre), mais os exportadores.

Mercado competitivo é o de não residentes, que têm a possibilidade de escolher o destino da sua viagem: na esmagadora maioria, são os turistas estrangeiros, que rentabilizam a Oferta de Turismo do País.

A Regulação da Gestão dos Aeroportos de Portugal é um instrumento fundamental para garantir que

-o mercado cativo não é vitima de excessos da gestão de um monopólio natural, como é o caso de cada um dos Aeroportos de Portugal,

-a acessibilidade aérea a Portugal contribui para a competitividade do sucesso da Oferta de Turismo, comercializada no mercado competitivo.

Por fim, mas não menos importante, esta Regulação é o instrumento que evita a captura da legislação por interesses de subsectores ou de empresas, como aconteceu, ao longo de anos, com a TAP pública.

Esta é a Procura/Oferta que está na base das viagens dos passageiros das Companhias Aéreas e dos serviços das Companhias de Assistência em Escala. A Regulação Económica

-ocupa-se da relação comercial entre estas companhias e a ANA, como gestora aeroportuária,

-deve, em nossa opinião, ter em conta a Procura/Oferta, sem a qual ... não há aviões a voar nem serviços de assistência em terra.

Como veremos a seguir, o decreto-lei de 2009, sobre Regulação Económica e da Qualidade de Serviço, abre uma janela para este mundo, quando prevê que, no Procedimento regulatório, o INAC consulte outras organizações, para além das companhias aéreas e de assistência em escala.

*Regulação Económica e Privatização da ANA

Desde os primórdios até 2009, a fixação das Taxas a Cobrar, resulta de um mecanismo rudimentar e estatizado:

-a iniciativa de alterar as taxas é do “accionista Estado (Ministério dos Transportes)” ou do “gestor Estado (ANA)”, e o montante a cobrar é fixado pelo “accionista Estado (Ministério dos Transportes)”, depois de parecer do “supervisor Estado” (INAC).

A partir de 2009, o montante do essencial das Taxas a Cobrar passa a estar sujeito a Regulação Económica, que assenta em dois grandes princípios

-após consulta alargada aos Utilizadores (3) dos aeroportos e Partes Interessadas (por exemplo, a Confederação do Turismo Português, CIP e outras), o Regulador Independente fixa, para um período de cerca de cinco anos, o “nível da receita média máxima por passageiro,

-após consulta aos Utilizadores dos aeroportos, a ANA fixar, anualmente, os montantes das Taxas a Cobrar.

Três observações:

-esta Regulação Económica implica um Regulador Independente, que só pode ser o INAC se este passar por profunda transformação cultural e de capacidade de intervenção independente do poder politico e interesses económicos,

-o modelo de “nível da receita média por passageiro” (o “cap”, em inglês) não é único, e qualquer dos modelos implica sempre definir um nível de remuneração do capital investido pela ANA,

-o decreto-lei de 2009 (4) introduz a Regulação da Qualidade de Serviço, que analisamos a seguir.

A decisão política de 2009 integra o então processo de privatização da ANA, no respeito do que já é uma boa pratica internacional:

-a Regulação Económica é importante para uma ANA pública e indispensável para uma ANA privatizada.

Analisamos a seguir a não aplicação da legislação de 2009 e do projecto politico sobre o INAC.

 

b)Contrato de Concessão Entre o Estado e a ANA Privada

*Colmatar o Atraso Inaceitável

Em 1998, é criada a ANA - Aeroportos de Portugal, SA, à qual “é atribuída a concessão de serviço público aeroportuário de apoio à aviação civil”. Factos a reter, de governos anteriores:

-entre 1998 e 2010, em violação das boas práticas nacionais e internacionais, nenhum Governo acorda o Contrato de Concessão com a ANA,

-em 2010, no âmbito da Formalização da Privatização da ANA, o Governo aprova “as bases da concessão do serviço público aeroportuário de apoio à aviação civil”,

-em 12 de Maio de 2010, um grupo de Deputados do PSD pede a Apreciação Parlamentar ao Decreto-Lei,

-ainda em 2010, uma Resolução do Conselho de Ministros aprova a Minuta do Contrato de Concessão (5). 

Em 2010, há um Decreto-Lei, há tempo para a sua Apreciação Parlamentar e há uma Minuta do Contrato de Concessão, aprovada por Resolução de Conselho de Ministros. O inaceitável atraso no acordar o Contrato de Concessão só não é completamente colmatado porque acaba por não ser assinado.

*A Pressa Inaceitável

Factos a reter do actual Governo:

-em 2011 o Programa do Governo da Coligação PSD/CDS prevê a privatização da ANA, com clara prioridade ao encaixe financeiro,

-apesar de conhecer a inexistência do Contrato de Concessão, o Governo não faz aprovar o Decreto-Lei que normalize a situação,

-a privatização da ANA é quase ignorada até ter ser apressada pela pressão de UE/BCE/FMI e a pressa acelerada, quando a receita passa a “contar para o deficit das Contas Públicas” de 2012,

-só em 29 de Outubro e com evidentes lacuna na sua Formalização, sobretudo em comparação com a de 2010, o Governo “Aprova o processo de privatização da ANA - Aeroportos de Portugal, S. A.” (Link).

Neste contexto de pressa e de pressa acelerada e sem qualquer consulta pública ou debate, é publicado o actual decreto-lei de 2012, a cuja contextualização e leitura crítica procedemos.

*Uma Realidade Não Menos Inaceitável

As disposições sobre “concessão do serviço público aeroportuário”, do decreto-lei de 2012, não são o equivalente da aprovação das Bases do Contrato de Concessão entre o Estado e a ANA, como é o caso de 2010.

Por outro lado, o Governo não desmente as notícias segundo as quais os candidatos à privatização da ANA já discutem com o Governo os termos do Contrato de Concessão – uma situação que nos parece anómala.

Admitindo que a Negociação Particular definida em Decreto-Lei (Link) permite esta proximidade, não é menos certo que teria sido mais transparente o Governo

-aprovar, por Resolução do Conselho de Ministros, uma Minuta do Contrato de Concessão e conduzir a negociação nessa base.

 

c)Sobre o Serviço Público Aeroportuário

*Uma Inaceitável Limitação ao Serviço Publico Aeroportuário

As disposições sobre Serviço Público Aeroportuário (Artigo 6º) dão força de lei à Clausula 8 da minuta do Contrato de Concessão aprovada em 2010 (Link). Citamos o número 4 do Artigo 6º:

-“4 – A Concessionária pode recusar a utilização das infra-estruturas aeroportuárias nos seguintes casos:

a) Às pessoas ou às entidades que não preencham as condições legais e regulamentares fixadas para esse efeito;

b) Aos utilizadores e aos utentes adicionais em caso de incapacidade das Infra-Estruturas Aeroportuárias disponíveis para suportarem a prestação de serviços.”.

O poder de recusar, legitimado pela alínea b), é inaceitável a três títulos

-em termos gerais, por atribuir à Concessionária um poder excessivo e susceptível de abuso que só tardiamente poderia ser sanado pela Autoridade da Concorrência,

-em termos substanciais, por já haver situações de aparente ou possível congestionamento do Aeroporto da Portela, que justificam intervenção acima dos interesses das partes,

-com as demoras habituais, estar em preparação um Regulamento Comunitário, que contribui para um exercício equilibrado do poder excessivo que o Estado concede à Concessionária [ver a seguir].

Em nossa opinião, a alínea b) do número 4 do Artigo 6º deve ser eliminada.

*”atribuição de faixas horárias em aeroportos congestionados”

Em 20 de Julho de 2012, este assunto já foi objecto de um post (Link) e a ”atribuição de faixas horárias em aeroportos congestionados” é objecto de um Decreto-Lei de 2008 (Link). É significativo que no decreto-lei de 2012

- não figure o Decreto-Lei de 2008, na lista de diplomas legais revogados,

-esta importante modalidade de Regulação Económica seja ignorada.

Actualmente, a regulação da gestão de slots é objecto de uma proposta da Comissão da União Europeia (Link), no âmbito do Better Airport Package, de 1 de Dezembro de 2011 (Link). Entre outros, o que está em causa é [o sublinhado é nosso]:

-More transparency about which airlines hold/use which slots and which slots are available. Greater independence for the authorities that allocate slots.

Sejamos concretos:

-a utilização de recursos limitados do Aeroporto da Portela por novas companhias (admitindo que as existentes não criariam problemas) e a crescente procura do hub da TAP deve ser objecto de Regulação Económica Independente e não deve poder ser decidida pela Concessionária, nos termos da referida alínea b) do nº 4 do Artigo 6º do decreto-lei de 2012.

Ao nível dos princípios, mantemos as duas propostas do post de Julho de 2012 e acrescentamos uma terceira:

-“a coordenação dos slots no aeroporto da Portela passa a ser da competência de Entidade Coordenadora Independente e não da ANA, com a sua tecnoestrutura e dependência do Governo”,

-as disposições legais em vigor “ poderem vir a tornar-se numa “renda de privilégio”, incluída no Perímetro da Privatização da ANA e fonte de conflito futuro com Companhias Aéreas,

-o decreto-lei de 2012 deve ser alterado de modo a incluir disposições que consagrem esta modalidade de Regulação Económica e antecipem o espírito do Regulamento Comunitário em preparação.

 

d)Regulação Económica

*O Resto e o Essencial

O Decreto-Lei de 28 de Novembro, preocupa-se com o facto da regulação relativa à gestão do sector aeroportuário se encontrar “dispersa por vários diplomas, situação que, atentas elementares razões de política legislativa, designadamente de segurança jurídica, importa minorar com a aprovação do presente decreto-lei”. Neste quadro, revoga uma alcatreva de diplomas legais, com a significativa excepção do mencionado na alínea anterior.

Feito este esforço, reduz as disposições sobre Regulação Económica a duas das quinze páginas que o texto do Decreto-Lei ocupa no Diário da Republica. Acontece que

-não se trata de um esforço de síntese clarificadora da legislação em vigor, cuja difícil leitura reconhecemos,

-é inaceitável minimização de disposições legais do decreto-lei de 2009.

Não dispomos de meios para analisar em detalhe esta minimização, mas podemos dar alguns exemplos significativos.

*Âmbito Reduzido da Consulta

O decreto-lei de 2012 introduz uma dupla redução da “consulta aos utilizadores”.

A primeira redução tem a ver com a eliminação da intervenção do INAC, ao qual, nos termos do decreto-lei de 2009 compete o iniciar do processo – no decreto-lei de 2012, o INAC deixa de ter esta iniciativa.

A segunda é a de reduzir a consulta a um diálogo entre a ANA e os utilizadores, definidos como “os operadores aéreos e os agentes de assistência em escala”. Esta opção é uma má tradição da Aviação Civil em vários países, na medida em que

-ignora Partes Interessadas relevantes, como é o caso da Confederação do Turismo Português, para o tráfego de passageiros e a Confederação da Industria Portuguesa, para o da Carga.

Com efeito o decreto-lei de 2009 previa, no processo de “Revisão da receita média máxima por passageiro” (Artigo 23º), a consulta

-“junto de outras estruturas organizativas de carácter representativo ou entidades, de nível local ou regional, que possam ter interesse legítimo nas decisões a tomar.”.

Que ganha o interesse publico com o suprimir a consulta mais alargada? 

*Remuneração do Concessionário

Uma privatização que visa “maximizar o encaixe” deve

-considerar a correspondente remuneração do capital investido por quem maximiza o encaixe,

-estabelecer mecanismos de Regulação Económica, para tornar transparente esta remuneração.

O decreto-lei de 2012 elimina muitas das disposições legais do de 2009, que contribuíam para esta transparência, de entre as quais destacamos

-fixar o modelo de single till e toda a detalhada metodologia de fixação do nível de receita média máxima por passageiro (o “cap”),

- valorizar e definir detalhadamente o “Procedimento Regulatório”.

Sabemos que o sucesso de qualquer legislação técnica, como é o caso, depende muito da sua aplicação. Dito isto, entre as disposições do decreto-lei de 2009 e o quadro minimalista do de 2012, o interesse público está, à partida, melhor definido se houver disposições legais explicitas a cumprir.

*Níveis de Qualidade de Serviço

O decreto-lei de 2009 incluía uma secção inovadora sobre “Regulação da qualidade de serviço” e limitada a dois artigos. O Decreto-Lei de 2012 suprime o Artigo 22º (Qualidade de serviço), do qual citamos:

-“1 — O INAC, I. P., estabelece para cada aeroporto, para outro aeródromo ou para cada rede aeroportuária abertos ao tráfego comercial, um conjunto de indicadores e de níveis de qualidade de serviço a atingir em cada período de regulação. […]

3 — Os indicadores de qualidade previstos no presente artigo respeitam aos procedimentos de check -in, do controlo de segurança e de passaportes, de recolha de bagagens, tempos de ligação entre voos, entre outros, praticados em cada aeroporto ou aeródromo.”.

O decreto-lei de 2012 remete o assunto para o diálogo entre ANA e Utilizadores, eliminando a fixação pelo INAC de níveis de serviço para indicadores precisos, como os explicitados no nº 2 do artigo 22º.

Repetimos a pergunta: que beneficia o interesse publico com a eliminação deste Artigo a definir a Qualidade de serviço?

Importa não esquecer que a inexistência de regulação destes indicadores de qualidade de serviço contribui muito para a dramática degradação do serviço de Assistência em Escala, no Aeroporto da Portela, em 2006/2007.  

*A “autoridade reguladora independente”

O preâmbulo do decreto-lei de 2009 começa por situar o novo quadro jurídico da Regulação Económica, MAS, e é um grande MAS, explicita uma proposta politica adicional, a desenvolver, em paralelo no tempo:

-“ O prosseguimento destes objectivos requer não só uma alteração ao quadro legal vigente, como a criação de um novo regime autónomo, no âmbito da qual se definam e delimitem, com precisão, as funções de regulação económica, que são atribuídas ao Instituto Nacional da Aviação Civil, I. P., que exercerá as correspondentes funções de autoridade reguladora.”.

Retemos dois factos:

-entre Setembro de 2009 e Novembro de 2012, os Governos de José Sócrates e de Pedro Passos Coelho partilham o mesmo desígnio: não implementar a Regulação Económica e não criar o referido “novo regime autónomo” do INAC,

-em Novembro de 2012, o Governo de Pedro Passos Coelho limita-se a dispor que o INAC é a “Autoridade reguladora independente”, para efeito da Regulação Económica, consagrando o esquecer do projecto politico de 2009.

Conhecedores da frustrante experiência nacional em matéria de Regulação, acreditamos que o Decreto de 2012, porventura sem consciência disso, abre a via para a captura do frágil INAC por interesses em presença, no novo cenário da Aviação Civil em Portugal.

*Intervenção da Autoridade da Concorrência

Começamos por uma constatação (6):

-“from the interdependencies between regulation and competition in the field of “airport-policy” it follows that a high degree of co-operation between the authorities in charge of competition law enforcement is necessary. Combining regulatory and competition policy competencies concerning airports might be the best institutional design.”.

Quase tudo do que segue tem a ver com Regulação e Aeroportos. Devemos ter em conta dois aspectos de uma visão mais larga do que nos ocupa:

-“inter-airport competition has effect on inter-airline competition and vice versa. Effective competition in the market of air transport requires functioning competition in both markets […]. This high mutual dependence of the two markets makes an “air transportation authority” superior to a narrowly defined (industry-specific) “airport regulatory authority”

-“Although the air transportation market is a specific market in that sense that other forms of transportation are no (close) substitutes, assigning regulatory law and competition law enforcement to the general competition authority might be advantageous.” (p. 226).

O assunto exige ponderação, que é incompatível com a «pressa acelerada» do processo em curso da privatização da ANA. Levantamos questões a considerar:

-é ou não necessário definir o âmbito da intervenção da Autoridade da Concorrência na Regulação Económica da Aviação Civil, em termos gerais ou em casos particulares como os da Assistência em Escala, onde está em causa o acesso ao mercado por empresas prestadoras de serviços?

-com a sua longa tradição de estatização e de falta de afirmação, será o INAC a entidade reguladora da Regulação Económica da Aviação Civil, ou não será de considerar integrar esta entidade reguladora na da Concorrência ou na prevista para os Transportes?~

Sem nos alongarmos sobre um tema de importância crucial, citamos uma referência à experiência internacional em matéria de alargar o âmbito de intervenção da Entidade Reguladora Independente da Aviação Civil:

-“Generally, the narrower the industry coverage of a regulatory agency the higher the probability te regulator is captured by the regulated firms.” (p. 222).

 

*A Questão de Fundo

Este ou próximo Governo terão de consagrar força politica à resposta a uma questão de dimensão cultural, politica, administrativa e empresarial:

-como enxertar mecanismos de cariz liberal num Sistema de Relações pouco aberto e transparente e muito estatizado, como tem sido e é o da Aviação Civil em Portugal.

 

A Bem da Nação

Albufeira 29 de Novembro de 2012

Sérgio Palma Brito

 

Referências

 (1)A expressão “taxas aeroportuárias” é utilizada na linguagem corrente como as taxas que são cobradas a actividades económicas que têm lugar no perímetro de um aeroporto. Na legislação nacional e comunitária, Taxas Aeroportuárias tem, pelo menos em três casos, uma definição legal. A expressão “taxas a cobrar” é utilizada por vários diplomas legais, para designar o que são, de facto, taxas a cobrar e evitar utilizar a expressão “taxas aeroportuárias”, e induzir em erro com a sua definição legal.

(2)Regulação Económica está definida no Artigo 4º do Decreto-Lei nº 217/2009, de 4 de Setembro (designado por “decreto-lei de 2009”) e pelo Artigo 66º do Decreto-Lei nº 254/2012, de 28 de Novembro (designado por “decreto-lei de 2012”). Fora deste contexto legal Regulação Económica designa a Regulação Pública (e não pelo Mercado) de actividades económicas, que podem ser a Gestão dos Aeroportos de Portugal, o Transporte Aéreo de Passageiros ou a noção mais abrangente da Aviação Civil em Portugal.

(3)O decreto-lei de 2012 define Utilizadores  como “os operadores aéreos e os agentes de assistência em escala”.

(4)Ver, na Nota (2), a origem das designações  “decreto-lei de 2009” e “decreto-lei de 2012”, criadas para evitar repetir o enunciado formal.

(5)O Decreto-Lei n.º 33/2010, de 14 de Abril “Aprova as bases da concessão do serviço público aeroportuário de apoio à aviação civil, compreendendo o estabelecimento, o desenvolvimento, a gestão e a manutenção das infra-estruturas aeroportuárias dos aeroportos de Lisboa, do Porto, de Faro, de Ponta Delgada, de Santa Maria, da Horta, das Flores e do Terminal Civil de Beja, bem como de novos aeroportos, incluindo o novo aeroporto de Lisboa”;

-A Resolução do Conselho de Ministros n.º 34/2010, de 6 de Maio “Aprova a minuta do contrato de concessão do serviço público aeroportuário de apoio à aviação civil a celebrar entre o Estado Português e a ANA - Aeroportos de Portugal, S. A.”.

Em 12 de Maio de 2010, um grupo de Deputados do PSD pede a Apreciação Parlamentar deste Decreto-Lei. Em 16 de Julho de 2010 é aprovada a Lei nº 29/2010, de 2 de Setembro, da Assembleia da República sobre “Primeira alteração, por apreciação parlamentar, ao Decreto -Lei n.º 33/2010, de 14 de Abril”.

Ver o Documento de Trabalho do post “Privatização da ANA, SA (2): Quinze Anos de Privatização e Dois Para Vender” (Link).

(6)Bernhard Duijm, On the Institutional Setting of Ex-Post REgulation in Regulated Industries, em The Economic Regulation of Airports, Edited by Peter Forsyth, David W. Gilen, Andreas Knorr,  Otto G. Mayer, Hans-Martin Niemeier and David Starkie, Ashgate, 2004, (p. 213/229)

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